“Auto-retrato de um louco quando jovem”
...Prazer, Ele.
Não foi nada de muito difícil para aquele garoto, o tal que tinha medo de recreio: isso foi deduzido depois de alguns colegas de sala terem lido frases horríveis no caderno dele sobre esse assunto. Não vejo por que todo esse horror ao intervalo de descanso escolar. Pra mim é a melhor parte do dia, principalmente quando se está no terceiro ano e pede-se a Deus que o ensino médio acabe-se logo – tudo enche o saco facilmente.
Ele tinha barba grande e olhar estranho. Acho que Ele fumava maconha... mas... voltando ao assunto;
Ele cochilava (como de costume) enquanto equilibrava a cadeira nas duas pernas de trás e escorava-se na parede – coisa que Ele dominava hermeticamente – quando por provável obra de macumba, as pernas da cadeira escorregaram derrubando-o. A sala de aula veio a baixo de tantas risadas.
...bem, esse é o ponto inicial de toda a história, simplesmente porque é o dia que eu notei que Ele existia. Eu achava que o tal era um novato e era seu primeiro dia na turma, então perguntei aos colegas e me responderam que Ele estava na sala desde o começo do ano, mas que era muito quieto e que por isso eu não o tinha notado.
Vi, depois, uma pessoa convidá-lo a uma festa que rolaria no final da aula. A resposta foi interessante:
— vou não, não costumo participar de manifestações públicas sem propósito aceitável.
Pensei: o que seria um propósito aceitável? Talvez uma manifestação contra a caça das baleias?
— não dá pra me imaginar participando disso.
Ele era realmente do tipo caladão, mas muito popular. Percebi que não ligava muito pras aulas (sempre cochilando, com as pernas atrepadas), mas, sei lá como, conseguia tirar as melhores notas da sala. Eu achava que Ele devia ser amigo dos professores, mas essa minha tese seria derrubada posteriormente. Às vezes durante a aula de matemática, o cara ficava lendo um desses clássicos da literatura (brasileira, lógico, o barbudo dizia-se ter preconceito contra escritores ingleses e americanos. Lia autores de outras nacionalidades, mas preferia os de língua portuguesa).
Um dia, durante um desses referidos episódios, resolvi me dirigir a Ele:
— hei, perguntei baixinho, você não gosta de matemática?
— gosto sim, respondeu meio incomodado.
— por que não presta atenção na aula, então?
— tô prestando, Ele cochichou, mas eu finjo estar lendo outra coisa, por que... posso te contar uma história?
— pode, claro! Respondi chamando-o para o fundão da sala.
CONTINUA...
...Prazer, Ele.
Não foi nada de muito difícil para aquele garoto, o tal que tinha medo de recreio: isso foi deduzido depois de alguns colegas de sala terem lido frases horríveis no caderno dele sobre esse assunto. Não vejo por que todo esse horror ao intervalo de descanso escolar. Pra mim é a melhor parte do dia, principalmente quando se está no terceiro ano e pede-se a Deus que o ensino médio acabe-se logo – tudo enche o saco facilmente.
Ele tinha barba grande e olhar estranho. Acho que Ele fumava maconha... mas... voltando ao assunto;
Ele cochilava (como de costume) enquanto equilibrava a cadeira nas duas pernas de trás e escorava-se na parede – coisa que Ele dominava hermeticamente – quando por provável obra de macumba, as pernas da cadeira escorregaram derrubando-o. A sala de aula veio a baixo de tantas risadas.
...bem, esse é o ponto inicial de toda a história, simplesmente porque é o dia que eu notei que Ele existia. Eu achava que o tal era um novato e era seu primeiro dia na turma, então perguntei aos colegas e me responderam que Ele estava na sala desde o começo do ano, mas que era muito quieto e que por isso eu não o tinha notado.
Vi, depois, uma pessoa convidá-lo a uma festa que rolaria no final da aula. A resposta foi interessante:
— vou não, não costumo participar de manifestações públicas sem propósito aceitável.
Pensei: o que seria um propósito aceitável? Talvez uma manifestação contra a caça das baleias?
— não dá pra me imaginar participando disso.
Ele era realmente do tipo caladão, mas muito popular. Percebi que não ligava muito pras aulas (sempre cochilando, com as pernas atrepadas), mas, sei lá como, conseguia tirar as melhores notas da sala. Eu achava que Ele devia ser amigo dos professores, mas essa minha tese seria derrubada posteriormente. Às vezes durante a aula de matemática, o cara ficava lendo um desses clássicos da literatura (brasileira, lógico, o barbudo dizia-se ter preconceito contra escritores ingleses e americanos. Lia autores de outras nacionalidades, mas preferia os de língua portuguesa).
Um dia, durante um desses referidos episódios, resolvi me dirigir a Ele:
— hei, perguntei baixinho, você não gosta de matemática?
— gosto sim, respondeu meio incomodado.
— por que não presta atenção na aula, então?
— tô prestando, Ele cochichou, mas eu finjo estar lendo outra coisa, por que... posso te contar uma história?
— pode, claro! Respondi chamando-o para o fundão da sala.
CONTINUA...
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